OAB Subseção Pelotas

Criminologia Queer e a Inclusão Racial no Judiciário pautam Semana do Advogado

publicado sábado, 17 de agosto de 2019 em Notícias

A noite de quinta-feira, 15 de agosto, foi marcada por mais um encontro da Semana do Advogado 2019. Na programação, as palestras “Manifesto por uma criminologia Queer”, promovida pela Comissão Especial de Diversidade Sexual e Gênero (CEDSEG) da Subseção, e “Inclusão Racial no Poder Judiciário”, proposta pela Comissão do Jovem Advogado (CJA) da OAB Pelotas.

No primeiro momento, o pró-Reitor de Graduação da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), Renato Dias, doutor em Educação, abordou a Criminologia Queer, trazendo as significações e os estudos culturais sobre o movimento Queer, surgido no fim dos anos 1970, cujo foco de análise são os processos de desconstrução discursiva das normas dominantes (heteronormatividade), que promove desigualdades e legitima violências (opressões) contra as dissidências sexuais.

Segundo Renato, o campo de estudo Queer busca pensar formas e mecanismos de desconstrução da sociedade heteronormativa violenta, que te obriga a ter certas posturas enraizadas. Nela, variações comportamentais que fogem da tradicional ideia de masculinidade e feminilidade, ligadas à estrutura de relações “aceitáveis” na sociedade normativa, ocasionam reações e posicionamentos que fazem com que esses indivíduos se tornem vulneráveis.

O palestrante abordou a criminologia feminista como ruptura e falou sobre a criminologia cultural, estudo que busca compreender o cotidiano desses sujeitos, como vivem e que relações de poder estão implicadas nas suas vivências, para compreender como se dão essas violências. Renato trouxe ainda as nuances de uma violência queer, divididas em violências simbólicas, como a negação de representações positivas de sujeitos LGBT, a construção de personagens estereotipados e a frequente afirmação de violações contra essa cultura, que, ao contrário de outros grupos, sofre repressão até mesmo em casa; violências institucionais, pregadas pelo Estado, como a negação de trocas do prenome nas escolas ou o desrespeito ao nome social na saúde pública; e violências interpessoais, LGBTFobia individual, crescente em um modelo de sociedade que compactua com discursos de dirigentes que abominam diferenças, e que se reforçam por discursos de ódio proferidos por pessoas com certa representatividade.

Por fim, Renato Dias trouxe algumas ações julgadas no STF, como a Ação direta de inconstitucionalidade por omissão 26/DF, de 2013, e o Mandado de Injunção (MI) 4733, protocolado em 2012 pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros. “Precisamos mudar o modelo de cultura que gera violência e que oprime o sujeito de forma simbólica”, finalizou.

No segundo momento da noite, a Juíza da 1ª Vara do Júri de Porto Alegre, Karen Louise Vilanova Batista de Souza, trouxe para discussão o tema “Inclusão Racial no Poder Judiciário. Karen iniciou falando sobre o racismo cotidiano e fez um paralelo com o fim da escravidão no Brasil e as consequências da opressão pós liberdade, abordando o mito da democracia racial e em harmonia que vivemos hoje, com o silenciamento da comunidade negra.

Conforme a palestrante, citando relatório da ONU de 2014 sobre a situação da discriminação no Brasil, no país, o racismo estrutural e o racismo institucionalizado, tratamento diferenciado entre raças no interior das organizações, com práticas e comportamentos discriminatórios no ambiente de trabalho, permeia todas as áreas da vida. No âmbito jurídico, em censo realizado em 2015, apenas 15,6% dos magistrados se declararam negros e pardos, sendo 14,2 pardos e 1% negros. Após a política de reserva de vagas, o percentual passou para 18,1%, número que cai para 3% quando analisamos o Rio Grande do Sul e 1% as mulheres negras. “Se existe reserva de vagas, porque não estão sendo preenchidas?”, questionou, trazendo para a discussão fatores sobre a inclusão racial, opressão e como reverter às desigualdades que afastam das oportunidades. Segundo a juíza, homens brancos possuem 8,2 vezes mais chances de serem juízes que mulheres negras e juízes brancos possuem 4,6 vezes mais chances de se tornarem desembargadores que juízas negras nas mesmas condições.

Karen Souza falou ainda sobre quem são hoje os juízes e juízas negros brasileiros, o encontro nacional realizado desde 2017 para debater o tema e discutir as barreiras raciais na magistratura, desconstruindo práticas racistas no ambiente jurídico e comentou algumas boas práticas, como as bolsas para estudantes negros da Ajuris e do Instituto de Acesso à Justiça, a criação do Comitê de Inclusão de Gênero, Raça e Diversidade junto ao TJRS, a criação da Secretaria da Igualdade Racial, em andamento junto à Associação dos Magistrados do Brasil e o Projeto Incluir Direito, do CESA, eu busca inserir advogados negros nos quadros de grandes escritórios, com projetos de mentoria, buscando incluir, preparar e reter esses profissionais, criando oportunidades e combatendo o racismo dentro e fora do ambiente corporativo.

Para Karen, precisamos de um judiciário diverso, com ideias, pensamentos e princípios diversos, pois as experiências que passamos interferem na forma como percebemos o mundo. Para isso, é necessário que a identidade seja fortalecida. “Nos colocarmos em evidência em determinados espaços tem essa função. Eu desejo que outras mulheres negras se referenciem em mim e formem sua identidade, que vejam que podem ocupar o espaço que eu ocupo. É a teoria do reconhecimento. Você forma sua identidade enquanto mulher negra capaz e sujeito de direitos”, finalizou, completando a noite falando sobre a juíza Mary de Aguiar Silva, magistrada baiana, que atuou entre 1962 e1995 e é considerada a primeira juíza negra do país.

OAB - Subseção Pelotas

Rua Osvaldo Aranha, 71 - Pelotas-RS

CEP 96075-170

Ouvidoria

ouvidoria@oabpelotas.org.br

Secretaria

pelotas@oabrs.org.br

(53) 3222-3218
Desenvolvido por Jeferson Sigales